sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Jamais Extinguir o Senhor Grave.

Assim eu li em um cartaz, ou melhor, vários, que de tantos pensei que fosse um “serial-killer”, até que, prestando bem atenção, vi que se tratava de um inocente: procura-se o Acento Grave que está sendo acusado de excessividade, confusão, humilhação.
- Mas que barbaridade é esta? Acusar um inocente é crime, e quem pode terminar em juízo é o senhor, por estar colocando tais cartazes.
- O senhor me perdoe, só estou cumprindo com meu dever, que é receber ordens, mas já que está tão interessado pode reclamar ao senhor delegado.
Ao chegar à delegacia fui logo me adiantando:
-Quero falar com o senhor delegado.
E quem é o senhor? Assim me perguntou um policial.
-Sou o advogado do Acento Grave e quero tomar satisfações de tais acusações que fazem do meu cliente, um procurado por toda a polícia de meu Estado.
O senhor aguarde porque o delegado está muito ocupado para atendê-lo no momento.
A partir daí fiquei mais revoltado, além de acusar um inocente, ainda pormenoriza as pessoas, quem este senhor pensa que é? Só porque tem um diploma acha que pode fazer isto? Ah, ele vai ver só quando eu entrar naquela sala, ou melhor, se eu entrar.
Depois de duas horas consegui falar com o tal delegado e fui logo tratando do assunto.
-Gostaria de ver as acusações do senhor, meu cliente, Acento Grave.
-Pois não, mas antes gostaria que se identificasse.
-Sou advogado dele.
-Sua identificação por favor.
-Sou apenas um simples cidadão que gosta de estudar, conhecer, defender sua língua, não possuo título de bacharel, mas neste caso me considero um, pois não vejo problema em querer defendê-lo.
-Pois há sim. Sem curso não tem direito de exercer. Mas considerando que o senhor esperou tanto e foi o único, até agora, a querer ajudá-lo, dar-lhe-ei algumas informações que o ajudarão a compreender o caso.
-O fato é: desde que nasceu, ele vem causando graves problemas. Estes, principalmente a maioria dos deputados, ou melhor, aos políticos que por “trabalharem” tanto não têm tempo de ficar se aprimorando na língua vernácula, e também dos profissionais que obtêm nota mínima em português. Na parte pobre (de conhecimento) da população, às vezes, nem o conhece, onde vai ser difícil sua busca nesta região.
Digo problemas a eles porque sentem-se envergonhados quando erram na sua colocação.
-Talvez não errassem se se dedicassem mais!
-Como?
-Nada senhor delegado, continue.
-Então... Um senhor muito honrado e “culto” decidiu ir em busca do Acento Grave para extingui-lo da nossa língua.
-Então quer dizer que se apenas uma pessoa decide extinguir algo, todos aceitam, mesmo que esta seja inocente?!
-O senhor tem que entender. Caso seja aprovado o projeto de lei, ele se tornará um foragido e para que isto não aconteça estamos procurando-o para decretar a prisão preventiva.
-Como?! Mas ele não está sendo acusado de nada e irei provar.
-Saí cabisbaixo sem saber como ajudar o Acento Grave, pois não dispunha de título. Foi aí que veio a grande idéia de fazer um abaixo-assinado, procurar advogados que pudessem me ajudar nas questões burocráticas e os sábios conhecedores da língua para realizar oficinas em vários lugares deste país para ensinar aos carentes (de conhecimento) sobre o Acento Grave, pois desta maneira não teriam como condená-lo.
Muitas pessoas queriam a condenação, pois explicavam que para o país se desenvolver teriam que exterminá-lo. Contudo, as oficinas foram um sucesso, os alunos adoraram o senhor Grave e já sabiam onde e como usar e passavam o conhecimento aos que não puderam participar. Conseqüentemente o abaixo-assinado também foi um sucesso, pois a maioria, que nem o conhecia, adorou conhecê-lo e ao mesmo tempo não entendia porque tanta confusão se ele fica apenas em cima de uma vogal.
Levamos ao Congresso e outros aderiram à campanha. Depois de um tempo todos os cartazes foram retirados e o Acento Grave voltou a “desfilar” em cima do “a”.
E como em todos os contos de fada, aqui também tem final feliz e castigo para os malvados.
Os que queriam sua extinção tiveram que estudar para conhecê-lo, pois agora a população já o conhecia, não usando-o mais errado e em toda escola ouvia-se:
-Vamos aprender como usar o senhor Grave. Primeira regra...

09.2006





P.S. Baseado do texto “A Crase na Mira da Lei”, publicado na revista Língua Portuguesa nº 2, de outubro/novembro de 2005.



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